Aprender Não É Experiência
A palavra aprender tem uma grande importância. Existem dois tipos de aprendizagem. Para a maioria de nós, aprender significa
acumular conhecimento, experiência, tecnologia, uma habilidade,
uma língua.
Existe também a aprendizagem psicológica, o aprender através da experiência, ou das experiências imediatas da vida, que deixam um certo resíduo, da tradição, da raça, da sociedade.
Existem estas duas formas de aprender a encarar a vida: psicológica e fisiológica; a capacidade exterior e a capacidade interior. Não existe verdadeiramente uma linha de demarcação entre as
duas; elas justapõem-se.
De momento, não estamos a falar da habilidade que aprendemos através da prática, do conhecimento tecnológico que adquirimos através do estudo.
Aquilo de que estamos a tratar é da aprendizagem psicológica que fomos fazendo ao longo dos séculos ou que herdámos sob a forma de tradição, de conhecimento, de experiência. A isto chamamos aprender, mas questiono se isso tem alguma coisa a ver com aprender.
Não
me refiro a aprender uma habilidade, uma língua, uma técnica,
mas estou a perguntar se a mente alguma vez aprende em termos
psicológicos. Ela aprendeu, e com o que aprendeu enfrenta o desafio da vida. Está sempre a traduzir a vida ou o novo desafio à luz daquilo que aprendeu. É isso que andamos a fazer. Isso é
aprender'.’
Não implicará o aprender algo novo, algo que desconheço e que estou a aprender? Se estou simplesmente a acrescentar ao que já conheço, então isso já não é aprender
Para Aprender, a Mente Deve Estar Silenciosa
Para descobrirem algo novo vocês devem começar a fazê-lo
sozinhos; devem iniciar uma caminhada completamente desnudados, especialmente no que diz respeito ao conhecimento, porque é muito fácil, através do conhecimento e da crença, ter experiências; mas tais experiências são meros produtos da auto projeção, e como tal completamente irreais, falsas.
Se quiserem descobrir por vós mesmos o que é o novo, não é bom carregarem o fardo do que é velho, especialmente o conhecimento — o conhecimento que têm do outro, por maior que seja.
Vocês usam o conhecimento como um meio de proteção de vós mesmos, de segurança, e querem ter a certeza absoluta de que irão ter as mesmas experiências que teve Buda ou Cristo ou o senhor X. Mas alguém que está constantemente a proteger-se através do conhecimento não é, obviamente, alguém que procura a verdade...
Nenhum caminho conduz à descoberta da verdade... Quando
vocês querem encontrar algo novo, quando estão a experimentar
o que quer que seja, a vossa mente tem de estar muito silenciosa,
não é assim?
Se a vossa mente estiver apinhada, a transbordar de fatos, conhecimento, eles funcionam como um impedimento ao novo; a dificuldade, para a maioria de nós, reside no fato de a mente se ter tornado tão importante, tão predominantemente significativa, que interfere constantemente com tudo o que possa ser novo, com qualquer coisa que possa existir em simultâneo com o que é conhecido.
Assim, o conhecimento e o aprender são impedimentos para aqueles que procuram, para aqueles que tentam compreender aquilo que é intemporal.
(A vida: 365 meditações diárias, Krishnamurti)
“O que é mais importante: descobrir o propósito da vida ou libertar a mente dos seus condicionamentos? Quando a mente se liberta de seus condicionamentos, o propósito é essa própria liberdade. Só quando livres, portanto, é que podemos descobrir qualquer verdade.
Dessa maneira, o primeiro requisito é a liberdade e, não, buscar
o propósito da vida. Sem liberdade, obviamente que não podemos
descobri-lo; sem estarmos livres de nossas próprias tolas e insignificantes necessidades, buscas, ambições, cobiça e aversões, sem liberdade em relação a essas coisas, como podemos investigar ou
descobrir qual é o propósito da vida?
Quando fazemos essa pergunta,
precisamos descobrir, primeiro, se aquele que pergunta, o que investiga, pode compreender."
(Sobre a liberdade, Krishnamurti)
O que estamos tentando discutir e descobrir é se a vida tem um
propósito e se é possível medir esse propósito. E só podemos medi-lo em termos do conhecido, em termos do passado e, quando meço
o propósito da vida em termos do conhecido, eu o meço conforme
aquilo de que gosto e de que não gosto. Assim, esse propósito ficará
condicionado pelos meus desejos, deixando, por isso, de ser o propósito.
A regeneração é agora, e não amanhã, pois a compreensão só se dá no presente. Não compreendem agora porque não põem todo seu coração e mente, toda sua atenção naquilo que desejam compreender.
Se puserem o coração e a mente para compreender, compreenderão.
Senhor, se der seu coração e mente para descobrir a causa da violência, se estiver plenamente consciente dela, será não-violento já.
(Sobre a liberdade, Krishnamurti)
Olhar com Intensidade
...Parece-me que aprender é surpreendentemente difícil, tal
como o é também o ouvir. Nunca ouvimos nada verdadeiramente,
porque a nossa mente não está livre, os nossos ouvidos estão
entupidos com as coisas que já conhecemos, e portanto o ato de
ouvir torna-se extraordinariamente difícil.
Penso — ou melhor, é um fato — que se conseguirmos ouvir algo com todo o nosso ser, com vigor, com vitalidade, então o próprio ato de ouvir torna-se um fator libertador, mas infelizmente vocês nunca ouvem realmente, pois nunca aprendem a fazê-lo. Afinal, só aprendem quando oferecem todo o vosso ser a algo. Quando vocês se entregam com todo o vosso ser à matemática, aprendem, mas quando se encontram num estado de contradição, quando não querem aprender, mas são forçados a fazê-lo, nessas circunstâncias a aprendizagem torna-se um mero processo de acumulação.
Aprender é como ler um romance com inúmeras personagens; requer a vossa total atenção, não uma atenção contraditória. Se quiserem conhecer uma folha - uma folha primaveril ou uma folha estival — devem olhá-la verdadeiramente, ver a simetria que há nela, a sua textura, a qualidade da folha vivente. Existe beleza, existe vigor, existe vitalidade numa simples folha. Portanto, para conhecerem a folha, a flor, a nuvem, o pôr-do-sol ou um ser humano, têm de olhar com toda a intensidade.
(A vida: 365 meditações diárias, Krishnamurti)
Ouvirem-se a Vós Mesmos
Questionador: Enquanto me encontro aqui a ouvi-lo, parece
que compreendo, mas quando estou longe daqui, não compreendo,
embora tente aplicar o que o senhor tem estado a dizer.
Krishnamurti: ...Está a ouvir-se a si mesmo, e não o orador.
Se estiver a ouvir o orador, ele torna-se o seu líder, a sua forma de
conseguir compreender — o que é um horror, uma abominação,
porque então terá estabelecido a hierarquia da autoridade. Portanto, o que está a fazer aqui é ouvir-se a si mesmo. Está a olhar
para o quadro que o orador está a pintar, que é o seu próprio
quadro, não o do orador. Se isto estiver claro, que está a olhar para
si próprio, então poderá dizer: «Bom, vejo-me tal como sou, e não
quero fazer nada a respeito disso» — e fica tudo por aí. Mas se
disser: «Vejo-me tal como sou, e tem de haver uma mudança»,
então começará a trabalhar a partir da sua própria compreensão
— o que é inteiramente diferente de pôr em prática o que diz o
orador... Mas se, à medida que o orador vai falando, estiver a
ouvir-se a si mesmo, então, a partir desse ouvir haverá clareza,
haverá sensibilidade; a partir desse ouvir a mente torna-se saudável, forte. Sem obedecer e sem resistir, ela torna-se viva, intensa — e só um tal ser humano pode criar uma nova geração, um novo mundo
Ouvir sem Esforço
Vocês estão, neste momento, a ouvir-me, não estão a fazer um esforço para prestar atenção, estão apenas a ouvir; e se houver verdade no que estão a ouvir, descobrirão uma mudança notável a ter lugar em vós — uma mudança que não é premeditada ou almejada, uma transformação, uma revolução completa na qual só a verdade pontifica e não as criações da vossa mente.
E se me é permitido sugeri-lo, digo-vos que devem ouvir tudo dessa forma — não apenas o que eu estou a dizer, mas também aquilo que outras pessoas dizem, os pássaros, o silvo de uma locomotiva, o ruído do carro que passa.
Descobrirão que quanto mais forem capazes de ouvir tudo, maior será o silêncio, e esse silêncio não é, então, quebrado pelo ruído. E somente quando vocês criam resistência em relação a algo, quando erguem uma barreira entre vós e aquilo que não desejam ouvir — só nesse momento existe uma luta.
(A vida: 365 meditações diárias, Krishnamurti)
Ouvir Traz Liberdade
Quando vocês fazem um esforço para ouvir, estão a ouvir? Não
será esse mesmo esforço uma distração que não permite que se
ouça? Fazem algum esforço quando escutam algo que vos deleita?
Vocês não podem estar conscientes da verdade nem ver o
falso como falso enquanto a vossa mente estiver de alguma forma ocupada com o esforço, com a comparação, com a justificação ou com a condenação.
Ouvir é um ato completo em si mesmo; o ato de ouvir traz,
em si mesmo, a sua própria liberdade. Mas será que vocês estão verdadeiramente preocupados com o ouvir, ou em alterar o vosso tumulto interior?
Se fossem capazes de ouvir... no sentido de
estarem conscientes dos vossos conflitos e contradições sem os
forçarem a moldar-se a um qualquer padrão de pensamento em
particular, talvez eles cessassem completamente.
Compreendem? Nós estamos constantemente a tentar ser isto ou aquilo, atingir um
determinado estado, ter um determinado tipo de experiência e evitar outro, de forma que a mente está continuamente ocupada com
algo; nunca está suficientemente tranquila para ouvir o ruído das
suas próprias lutas e dores.
Sejam simples, e não tentem tornar-se algo ou obter determinada experiência
(A vida: 365 meditações diárias, Krishnamurti)
Ser: que é ver o que é,
aceitar o que é, viver com o que é, sem tentar nenhuma espécie de
transformação nem condenação — ser gera virtude e nela há liberdade.
(Sobre a liberdade, Krishnamurti)
Ouvir sem Pensamento
Não sei se alguma vez ouviram um pássaro. Ouvir alguma
coisa exige que a nossa mente esteja silenciosa — não um silêncio místico, silêncio simplesmente.
Estou a dizer-vos algo e, para
me ouvirem, têm de estar silenciosos, e não com todo o tipo de
ideias a zunirem na vossa mente. Quando olham para uma flor,
olham para ela, sem estarem a dar-lhe um nome, sem a estarem a
classificar, sem dizerem que ela pertence a determinada espécie
— quando o fazem, deixam de a ver.
Assim, o que vos digo é que
ouvir é uma das coisas mais difíceis — ouvir o comunista, o
socialista, o deputado, o capitalista, qualquer pessoa, a vossa mulher, os vossos filhos, o vosso vizinho, o condutor do ônibus, o pássaro — apenas ouvir.
É só quando ouvem sem nenhuma ideia,
sem pensamento, que estão em contato direto; e ao estarem em
contato percebem se aquilo que o outro está a dizer é verdadeiro
ou falso; torna-se desnecessário discutir.
(A vida: 365 meditações diárias, Krishnamurti)
Para Além do Ruído das Palavras
Ouvir é uma arte a que não se chega facilmente, mas nela residem uma grande beleza e uma grande compreensão.
Ouvimos
com várias profundidades do nosso ser, mas o nosso ouvir tem
sempre lugar a partir de uma concepção prévia ou de um determinado ponto de vista. Não ouvimos simplesmente; está sempre
lá a intervenção do véu dos nossos próprios pensamentos, conclusões e preconceitos...
Para ouvirmos, necessitamos de uma
quietude interior, de estarmos libertos da pressão da aquisição,
uma atenção descontraída. Este estado de atenção passiva é capaz
de ouvir o que está para além da conclusão verbal. As palavras
confundem; são apenas os meios exteriores de comunicação; mas
para se conversar intimamente, para além do ruído das palavras,
deve haver no ouvir uma passividade alerta.
Aqueles que amam
podem ouvir; mas é extremamente raro encontrar um ouvinte.
A maioria de nós anda atrás de resultados, da consecução de
objetivos; estamos eternamente a superar e a conquistar, e com tal não conseguimos ouvir nada. É somente no ouvir que escutamos a melodia das palavras.
(O livro da vida: 365 meditações diárias - Krishnamurti)
Colocar os Véus de Lado
De que forma ouvem?
Ouvem com as vossas projeções, através da vossa projeção, através das vossas ambições, desejos,
medos, ansiedades, ouvindo apenas aquilo que desejam ouvir,
apenas aquilo que vos satisfará, que será gratificante, que proporcionará conforto, que irá aliviar, no momento, o vosso sofrimento?
Se ouvirem através do véu dos vossos desejos, então estão
obviamente a ouvir a vossa própria voz, estão a ouvir os vossos
próprios desejos.
E haverá alguma outra forma de ouvir? Não será
importante descobrirmos como ouvir não apenas o que está a ser
dito, mas tudo — os ruídos da rua, o chilrear dos pássaros, o barulho do eléctrico, o mar revolto, a voz do vosso marido, a vossa
mulher, os vossos amigos, o choro de um bebê?
O ouvir só é importante quando não estamos a projetar os nossos próprios desejos naquilo que estamos a ouvir. Será possível colocarmos de lado
todos estes véus através dos quais ouvimos, e sermos capazes de
ouvir realmente?
"A vida: 365 meditações diárias", Krishnamurti
Ouvir com Facilidade
Já alguma vez se sentaram muito silenciosamente, sem que a
vossa atenção estivesse fixada em coisa alguma, sem fazerem qualquer esforço para se concentrarem, mas com a mente muito silenciosa, completamente quieta?
Então ouvem tudo, não ouvem?
Ouvem os ruídos distantes tão bem quanto aqueles que estão mais
perto e aqueles que estão muito próximos, os sons circundantes
— o que significa realmente que estão a ouvir tudo. A vossa mente
não se encontra confinada a um pequeno canal estreito.
Se conseguirem ouvir desta maneira, ouvir com facilidade, sem esforço,
descobrirão que uma mudança extraordinária está a ter lugar dentro de vós, uma mudança que surge sem que a tenham desejado,
sem que a tenham pedido; e nessa mudança existem uma grande
beleza e uma percepção imediata e profunda.
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