Milonga de Manuel Flores
Manuel Flores vai morrer.
Isso é moeda corrente;
morrer é um desses costumes
que todo mundo consente.
E me dói ainda assim
despedir-me desta vida,
desta coisa tão de sempre,
tão doce e tão conhecida.
Olho minhas mãos na aurora,
olho nas mãos minhas veias;
com estranheza eu as olho
como se fossem alheias.
Virão os quatro balaços,
com os quatro o esquecimento;
Merím disse sábio: a morte
começa no nascimento.
Quanta coisa em seu caminho
estes olhos terão visto!
Quem sabe o que mais verão
depois que me julgue Cristo.
Manuel Flores vai morrer.
Isso é moeda corrente;
morrer é um desses costumes
que todo mundo consente.
Jorge Luis Borges